Percebemos que o caminho não era tão fácil como imaginávamos, mas pela primeira vez entendi a burocracia como algo importante. No caso da adoção ela age como uma peneira, para ver quem consegue ir até o fim.
Na verdade não deu tanto trabalho assim. Nós estávamos tão ansiosos que em uma semana arrumamos tudo o que foi exigido. É claro que ficamos horas em cartórios, aguardamos mais de três dias pela autenticação de uma das certidões e fizemos dois amigos perderem um turno de trabalho indo reconhecer firma de uma declaração de idoneidade moral.
Coincidiu que no dia da consulta ao médico especialista em esterilidade só faltava um único documento. Chegamos na hora marcada à consulta. Dr.Luís era, além de ginecologista, obstetra. Muito atencioso e procurando tornar o ambiente menos tenso, ele procurou nos deixar à vontade.
Eu imaginei que fosse ver fotos de dezenas de bebês nas paredes, como fazem os obstetras. Dois anos antes, quando eu ia com minha irmã grávida ao consultório do seu médico, achava linda a decoração feita de bebês que ele ajudou a trazer ao mundo.
Mas meu médico não tinha uma foto sequer. Ele tinha uma porção de bibelôs em uma estante. Eu imaginei que fosse uma por cada bebê que ele ajudou a nascer. Assim me senti mais confortável.
Perguntas e mais perguntas. Eu gosto das perguntas. Eu quero que ele me ajude a entender o motivo de eu não engravidar. Exames e mais exames. Só saberemos depois dos exames. O médico me fez tantas perguntas quanto a assistente social.
Tudo estava caminhando rápido. Ao mesmo tempo em que organizava os papeis exigidos para a adoção, estava fazendo os exames médicos para descobrir o porquê de eu não engravidar.
Olhei a guia que solicitava o exame de gravidez. Coitado. Só ele achava que eu estava grávida. Meu ciclo, muito irregular, me fez pensar uma centena de vezes: “agora estou”. Estava nada. Só mais um alarme falso. Mas fui fazer os exames assim mesmo.
No dia seguinte coletei o sangue num laboratório da APAE, que é uma associação que atende crianças mais que especiais, as que têm Síndrome de Down. O tempo que fiquei aguardando para ser atendida fiquei refletindo sobre estas crianças, e sobre a minha falta de altruísmo. Na duas únicas restrições sobre o tipo de criança a ser adotada, escolhi uma criança “saudável” e menor que dois anos.
Eu admiro os casais que adotam bebês com problemas de saúde, e sei que é muito delicado tratar deste assunto, mas eu não poderia simplesmente não pensar nele. Quem engravida sabe que o filho pode nascer com Síndrome de Down ou com outra doença congênita. Quem adota, sabe que existem centenas de crianças precisando de uma mãe.
Eu e meu marido pensamos muito sobre como seria o perfil criança que iríamos adotar. Acho que todo casal sonha em ter seu bebê, com sua carinha, nariz da mãe, olhos do pai, estas coisas. Na adoção, como isso não é possível, é comum desejarmos uma criança parecida. Cor da pele parecida, cabelo parecido, olhos parecidos.
Nas primeiras conversas sobre adoção, aliás, nós queriamos uma criança assim: olhos castanhos claros, pele clara, cabelos castanhos, com 8 meses de nascido. Eu achava que, se eu parisse, meu filho seria assim. Com o amadurecimento da idéia, depois da nossa história com Miguel, e com o conhecimento sobre o processo de adoção e das dificuldades das crianças que aguardam por uma mãe, mudamos muito nossos conceitos.
Sobre a cor da pele, imaginamos que, se recebêssemos um bebê loiro, de olhos azuis, ele poderia sofrer muito na escola. Como explicaríamos aqueles olhos e aqueles cabelos? Me preocupava dele ser rejeitado na escola, quando descobrissem o motivo de seus pais serem tão diferentes dele. Eu achava que ele iria sofrer. Na verdade, eu estava mascarando o meu sofrimento. Demorei a entender que a criança não está ali para me satisfazer e acabar com minhas frustrações.
Isso tudo é feio, mas se passou na minha cabeça. Hoje, enxergo que vou precisar educar meu filho, e amá-lo de forma que, quando for questionado, ele afirme que sim, que é adotivo, confiante, sem se sentir inferiorizado. Percebo que na verdade era a minha auto-estma que não me dava confiança do que eu estava fazendo. Não poderia passar esta insegurança para nosso filho. Então, resolvemos esquecer esta história de cor, e aceitar o presentinho que Deus estaria nos reservando, colorido como fosse.
Na verdade não deu tanto trabalho assim. Nós estávamos tão ansiosos que em uma semana arrumamos tudo o que foi exigido. É claro que ficamos horas em cartórios, aguardamos mais de três dias pela autenticação de uma das certidões e fizemos dois amigos perderem um turno de trabalho indo reconhecer firma de uma declaração de idoneidade moral.
Coincidiu que no dia da consulta ao médico especialista em esterilidade só faltava um único documento. Chegamos na hora marcada à consulta. Dr.Luís era, além de ginecologista, obstetra. Muito atencioso e procurando tornar o ambiente menos tenso, ele procurou nos deixar à vontade.
Eu imaginei que fosse ver fotos de dezenas de bebês nas paredes, como fazem os obstetras. Dois anos antes, quando eu ia com minha irmã grávida ao consultório do seu médico, achava linda a decoração feita de bebês que ele ajudou a trazer ao mundo.
Mas meu médico não tinha uma foto sequer. Ele tinha uma porção de bibelôs em uma estante. Eu imaginei que fosse uma por cada bebê que ele ajudou a nascer. Assim me senti mais confortável.
Perguntas e mais perguntas. Eu gosto das perguntas. Eu quero que ele me ajude a entender o motivo de eu não engravidar. Exames e mais exames. Só saberemos depois dos exames. O médico me fez tantas perguntas quanto a assistente social.
Tudo estava caminhando rápido. Ao mesmo tempo em que organizava os papeis exigidos para a adoção, estava fazendo os exames médicos para descobrir o porquê de eu não engravidar.
Olhei a guia que solicitava o exame de gravidez. Coitado. Só ele achava que eu estava grávida. Meu ciclo, muito irregular, me fez pensar uma centena de vezes: “agora estou”. Estava nada. Só mais um alarme falso. Mas fui fazer os exames assim mesmo.
No dia seguinte coletei o sangue num laboratório da APAE, que é uma associação que atende crianças mais que especiais, as que têm Síndrome de Down. O tempo que fiquei aguardando para ser atendida fiquei refletindo sobre estas crianças, e sobre a minha falta de altruísmo. Na duas únicas restrições sobre o tipo de criança a ser adotada, escolhi uma criança “saudável” e menor que dois anos.
Eu admiro os casais que adotam bebês com problemas de saúde, e sei que é muito delicado tratar deste assunto, mas eu não poderia simplesmente não pensar nele. Quem engravida sabe que o filho pode nascer com Síndrome de Down ou com outra doença congênita. Quem adota, sabe que existem centenas de crianças precisando de uma mãe.
Eu e meu marido pensamos muito sobre como seria o perfil criança que iríamos adotar. Acho que todo casal sonha em ter seu bebê, com sua carinha, nariz da mãe, olhos do pai, estas coisas. Na adoção, como isso não é possível, é comum desejarmos uma criança parecida. Cor da pele parecida, cabelo parecido, olhos parecidos.
Nas primeiras conversas sobre adoção, aliás, nós queriamos uma criança assim: olhos castanhos claros, pele clara, cabelos castanhos, com 8 meses de nascido. Eu achava que, se eu parisse, meu filho seria assim. Com o amadurecimento da idéia, depois da nossa história com Miguel, e com o conhecimento sobre o processo de adoção e das dificuldades das crianças que aguardam por uma mãe, mudamos muito nossos conceitos.
Sobre a cor da pele, imaginamos que, se recebêssemos um bebê loiro, de olhos azuis, ele poderia sofrer muito na escola. Como explicaríamos aqueles olhos e aqueles cabelos? Me preocupava dele ser rejeitado na escola, quando descobrissem o motivo de seus pais serem tão diferentes dele. Eu achava que ele iria sofrer. Na verdade, eu estava mascarando o meu sofrimento. Demorei a entender que a criança não está ali para me satisfazer e acabar com minhas frustrações.
Isso tudo é feio, mas se passou na minha cabeça. Hoje, enxergo que vou precisar educar meu filho, e amá-lo de forma que, quando for questionado, ele afirme que sim, que é adotivo, confiante, sem se sentir inferiorizado. Percebo que na verdade era a minha auto-estma que não me dava confiança do que eu estava fazendo. Não poderia passar esta insegurança para nosso filho. Então, resolvemos esquecer esta história de cor, e aceitar o presentinho que Deus estaria nos reservando, colorido como fosse.
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