Arrumamos as malas nas pressas, mas resolvemos ir apenas no outro dia. Havia muito o que preparar até ele chegar aqui. Não havia berço, e era um bebê de quatro meses. Um menino. Não havia uma peça de roupa sequer, apenas um quartinho com uma cômoda, uma mini-cama e um guarda-roupa.
Fomos com minha mãe e minha irmã no shopping comprar uma roupas, lençóis, toalhas. Minha cunhada comprou mamadeiras, chupetas e pomadas. A sacolinha foi herdada de meu sobrinho Gabriel. O sonho estava se materializando.
De manhã bem cedo já estávamos na estrada. Contava os segundos para conhece-lo. A mãe biológica dele teria que assinar uns papeis para que eu pudesse sair com ele da cidade. Precisava encontra-la. O menino ela já havia deixado na casa de minha tia Maria um dia antes.
Pegamos um ferry-boat e mais duas horas de estrada. Era um misto de felicidade e medo... e a cidade se aproximava.
Chegamos em Valença cerca de 04 horas depois de nossa saída de casa. Eram 09:30 da manhã. Assim que começamos a estacionar o carro da porta da casa de minha tia, a minha prima saiu com ele nos braços. Eu praticamente pulei do carro. E meu coração quase pulou da minha boca. Ele era lindo. E sorriu pra mim.
Peguei o bebê nos meus braços e minha prima o chamou de Leozinho. Elas sabiam que mudaríamos o nome da criança para Alex Jr, então trataram de colocar logo um apelido nele. O pai, Léo. O filho, Leozinho. Ele continuava sorrindo. E eu estava completamente apaixonada. Pronto, meu coração e minha vida naquelas mãos pequenininhas. Eu o cheirei, beijei, não queria me esquecer de nenhum detalhe dele, dos seus olhos grandes e vivos, do seu sorrisinho brincalhão. Minha mãe logo pegou Leozinho nos meus braços e começou a beijar... e ele riu muito! Meu marido era só felicidade... Finalmente achamos nosso filho!
Era ele. eu tinha certeza. O peguei no meu colo novamente e ele se aconchegou em mim. Meu marido estava com medo de carregar, pois não sabia segurar um bebê. Estávamos tão felizes que parecia que estávamos num sonho lindo. Mas para este sonho começar a ser real, eu precisava de uma assinatura.
Deixamos nosso filho com minha mãe na casa de minha tia e começamos nossa busca. Fomos na casa da prima damãe biológica, próxima dali. Ela já havia voltado para a roça onde morava. Duas primas delas nos acompanharam até lá.
Passamos na casa da avó, para ver se ela não estava lá. Nada. E seguimos caminho para a roça. Muita estrada, muito asfalto. Foram mais ou menos mais 20 minutos de estrada e chegamos na casa dela. Era uma casinha de blocos, sem reboco. Telhas de cimento e muitas crianças. Sobrinhos dela. Uma mulher não muito feliz atendeu a porta e disse que ela estava na casa de uma amiga.
Eu já estava ficando preocupada. “Meu Deus, será que ela desistiu e não quer que a encontremos?” – era o que vinha na minha cabeça. E fomos para a casa da tal amiga. Estrada de barro. Mais 20 minutos. O minutos mais longos de minha vida.
As primas dela eram simpáticas. Imaginei como seria o nosso encontro. Enquanto ainda andávamos pela estrada uma das primas exclamou: ”olha ela ali!”. Alex parou bruscamente o carro. A prima dela pulou do carro e a chamou. A estrada tinha árvores que me impediam de ver a mulher. Só vi que alguém se aproximava. Era uma mulher morena. Coberlos negros, crespos. Finalmente o rosto. E um inesperado sorriso. Enorme sorriso. Tive medo, mas procurei mostrar confiança. Me apresentei e fui direto ao assunto: “para sairmos da cidade com se filho, precisamos que assine uns papéis e nos dê cópia de seus documentos”.
Ela prontamente entrou no carro e disse para seguirmos para a casa dela. Quando ela sentou no carro, Alex mal tinha dado a partida e eu perguntei: “menina, você não vai se arrepender disso?” – é óbvio que eu queria ouvir um não. E foi o que eu ouvi. “Eu ainda não senti saudades dele”, foi a resposta. Fiquei pensando nesta frase o caminho todo. “Ainda” foi a palavra que mais me preocupou.
Chegamos na casa dela e entramos. A irmã se retirou da sala. Ela era contra a doação do menino. As filhas da irmã dela eram crianças lindas. Mas o estado de pobreza as maltratava. Nos acomodamos no humilde sofá e li a declaração pra ela. Ela estava nervosa, não queria ler. Acho que estava com vergonha, não sei.
Mais uma vez, antes dela assinar, perguntei se ela tinha certeza. Ela, de novo, falou aquela frase “ainda não seni saudades dele”. Eu fiz de propósito. Perguntei de novo porque sabia que a resposta seria essa. Era a oportunidade que eu tinha pra dizer a ela o seguinte: “quando você sentir saudades dele ele vai estar muito longe daqui”. Ela me encarou, entendendo a seriedade da atitude. E assinou assim mesmo.
Alex saiu com as primas para tirar cópias dos documentos enquanto assinávamos tudo. A mãe dela não estava lá. Expliquei pra ela que haveria em Salvador uma audiência com o juiz, que assim que fosse marcada ela seria informada, e eu providenciaria tudo para que fosse levada até o juizado.
Alex retornou. Levantamos para ir embora. Não nos tocamos hora nenhuma. Nem quando nos apresentamos, nem quando nos despedimos. Não havia clima para beijinhos, abraços ou apertos de mão. Não era uma amizade, um favor, ou um negócio. Era a doação de um filho. Mantivemos uma distância. Tenho certeza que ela sentiu uma dor. Pelos olhos dela dava pra ver. Mas ela também viu meus olhos. Agora, o menino era meu.
Entramos no carro e antes de irmos bati uma foto da casa. A irmã dela apareceu na janela. Ela não gostava daquilo. Não gostava de nós. Queria o sobrinho dela ali, e não com estranhos.
Chegamos na casa de minha tia e ele estava dormindo. Eu não fazia idéia de como agir. Não sabia fazer um mingau sequer! E não havia tempo para muita coisa. Precisávamos pegar a estrada e chegar em Salvador ainda com o dia claro.
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